segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Percepções.

A pedidos de Juliana Paulino. (Minha adorada Juba)

A conversa começou numa aula de física experimental, quando tentávamos provar, empiricamente, a Lei de Lorentz. Não sei bem como surgiu, mas o assunto foi parar numa marca importada de um esmalte que custava não sei quantos reais. Eu, do alto de todos os meus conceitos previamente estabelecidos, claro, julguei como pura futilidade. E a Juba disse uma coisa que me deixou pensativa: que não era a coisa pela coisa, sabe? Não era pelo preço que a coisa custava ou pela utilidade que lhe era conferida, era a coisa pela sensação que ela provocava. Que, mesmo parecendo fúteis, a sensação provocada por determinadas coisas, em determinadas situações, era totalmente impagável.

Fui pra casa meio absorta. E só bem depois pude perceber o que Juba queria dizer.

Quando, em pleno sábado de sol, a única Skol sobrevivente no freezer estava completamente pedrada, eu e painho passamos uns bons minutos tentando descongelá-la, como quem tenta salvar um ente querido prestes a morrer de hipotermia... No fim das contas a tal da cerveja não prestou pra nada. Mas era justamente dessa sensação que a Ju falava. Da percepção que isso tinha causado.

Depois eu parei pra lembrar uma série de outras coisas, como minha edição de 1967 do “Cem anos de solidão” que eu não troco por dinheiro nenhum. Ou meu posterzinho, de uns 10 cm, de “ A viagem fantástica”, 1966, que eu guardo com tanto carinho. O que essas coisas têm de tão diferentes de um esmalte importado? Elas estão lá, guardadas na minha estante, como pequenos troféus intocáveis e significam muito pra mim. Mas para minha mãe são só um monte de papéis costurados numa capa azul. Porque é tudo uma questão de percepção.

Hoje, há pouco, entrei num ônibus ofegante de tanto chorar. Uma velhinha, de uns 70 e tantos, me disse uma daquelas frases clichês “não fique assim, tudo passa”. Nem tudo passou, mas, por hora, isso me trouxe uma paz, um alívio, sabe? Como se a barra não pesasse tanto.

Porque, às vezes, a gente só precisa descongelar inutilmente uma cerveja, ou comprar, futilmente, um esmalte de não sei quantos reais, ou ouvir qualquer frase clichê, pra se sentir bem...

Vanessa Daiany.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Poetizando.

Eu gosto de parar para observar, sabe? Sentar no ponto de ônibus e sentir o barulho das buzinas, das pessoas gritando, do sinal abrindo e fechando, desse lá-e-cá da faixa de pedestres.
Dos acenos, eu gosto de observar os acenos seguidos de pés apressados e mãos tateando um espaço, naquele amontoado de corpos, também procurando um espaço, quem sabe não somente um espaço físico...
E dos cabelos brancos, reunidos na pracinha, com um dominó sobre a mesa de cimento. Eu gosto da sabedoria dos cabelos brancos, e até da impavidez de quem já viveu muito. Muitos, talvez, nem tenham vivido tanto assim, apenas existido muito. Particularmente, gosto dos que viveram muito. Dos que têm estórias de guerras, sejam elas interiores ou não.
Apesar de não odiar os comunistas, gosto de quem diz que odeia comunistas, como meu avô, que viveu sob a máxima: “comunista come criancinha”. Na verdade, mal sabe ele, esses aí são os padres. 
Não acredito em deus, mas eu gosto de observar as pessoas ajoelhadas na igreja, cada uma com seu dilema interior, tentando entregar suas dores, e o que consideram seus pecados, a um ser superior inanimado. Eu gosto de quem tem fé. Não essa fé cega, que considera qualquer outro tipo de crença, uma crença inferior. Mas a fé inocente e doce da minha irmã, que acredita que se rezar para santa Clara, ela faz a chuva parar de cair. 
Eu gosto de parar um pouco, pra ver a vida passar. Depois eu corro ofegante, pra tentar acompanha-la, enquanto meu pulmão diz: - por favor, nunca fume.

Vanessa Daiany

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Mohenjo-Daro: uma sociedade igualitária na Idade do Bronze

Eu precisava vir aqui, limpar as teias de aranha...

Ultimamente uma coisa tem me fascinado – e intrigado. Trata-se de um achado arqueológico : talvez a maior cidade, e mais perfeita, construída há 4500 anos, às margens do rio Indo, no Paquistão. Uma cidade maior e mais confortável que as capitais dos egípcios e sumérios, dotada de um sistema de abastecimento com vasos sanitários de assento e canalização de esgoto em todas as casas; talvez tenha abrigado uma população de cerca de 100 mil pessoas.

“Tudo indica que sua arquitetura nada tinha de pomposo. Uma cidade para cidadãos comuns, com inúmeras casas geometricamente enfileiradas, centro de uma terceira cultura altamente desenvolvida dos primórdios da idade do bronze”. (Revista Geo).

As escavações não mostraram, até agora, indícios da existência de palácios, nem templos, ou estátuas. Ao contrário do Egito e Mesopotâmia, não há vestígios de nenhuma construção monumental, muito pelo contrário, o que se vê são casas com, aproximadamente, a mesma estrutura, que diferiam apenas no tamanho (50 ou 100 m²), feitas de tijolos com proporção estratégica (comprimento igual a duas vezes a largura e quatro vezes a altura), o que possibilitava ao construtor segurar o tijolo com apenas uma das mãos, enquanto a outra ficava livre para que se pudesse usar “argamassa”.

O fato é que há indícios de toda uma sociedade, na Idade do Bronze, de 100 mil pessoas, sem convicções religiosas exacerbadas, quem sabe uma sociedade atéia. E, coincidentemente, essa mesma sociedade também não apresenta indícios de uma hierarquia, seja governamental, seja religiosa: uma sociedade igualitária.

Enquanto, no Egito, centenas de milhares de escravos tiveram de cortar e transportar pedras monumentais, com o intuito de construir um túmulo para o seu “rei-deus”; em Mohenjo Daro, planejadores urbanos geniais desenvolviam toda uma nova cultura habitacional!

Dá pra imaginar o que seria da sociedade contemporânea sem deus(ses)?

 

Vanessa Daiany.